sábado, 10 de dezembro de 2016

Meses Áridos XI - Rememoração e Angústia

O já previsto apocalíptico verão faz-se sentir. Os termômetros batem recordes. E, ironicamente, de árido aqui não parece haver nada: é chuva, é umidade. Nublado é abafado, céu limpo é pele grelhada. E assim como a água do mar quente pela noite, cada gotícula no ar guarda em si a memória da terrível insolação vespertina.

Mas o tal elixir da deusa é daqueles que não se curvam às intemperanças térmicas do mundo contingente. Se ele falta, pode ser o contingente úmido ou seco, e ainda há de ser árido pela ausência de brilho ou glória. É tudo, enfim, pura estafa, letargia. Hei de confessar, no entanto, que pior é a solidão no verão, pois se o frio “abraça”, o calor só assa.

A estafa, no entanto, já segue contínua, resoluta, estável em sua trajetória. Atravessa invernos e verões (não há outras estações no clima tropical, e mesmo o inverno parece ser lendário) e continua esperando uma dose do elixir. No calor, porém, tudo é água, tudo é líquido. O que é elixir e o que é cerveja? O que é suor e o que é cachaça?

Provavelmente, o pior aspecto dos tais reais meses áridos seja justamente o recesso. A saudade carcome as vísceras, o contingente mundo tenta arrancar-te da metafísica e o estudo parece não progredir. No dia da almejada cerveja, cai a chuva. No dia de se lavar o tapete, raia o mais forte sol já visto. As tacanhas tarefas cotidianas arrancam qualquer glória enquanto a lâmina do amor não correspondido corta a garganta lentamente.

E onde estará a deusa? Se em sua mão tão poderosa e imortal substância pode reavivar qualquer soldado ferido em batalha, por que haveria ela de se preocupar? Mas a Deusa é a Deusa. Seletiva como tantas e tantas mortais. E mede o mérito da raça humana a partir dos mais tacanhos princípios morais. Requer sobretudo que não haja maldade. Aí, Deusa, pedes demais!

Há os que deste elixir se agraciem, aproveitando-se do eventual estado ébrio da deusa para tomarem, ocultadamente, o quinhão que lhes parecer suficiente. E nem tão difícil é, pois a deusa que vive entre mortais, na ebriedade não difere simples álcool de éter. Aliás, ela gosta de baladas regadas a vodca. Sua formosura é o único denário requerido.

Eu, no entanto, e alguns tantos outros, deixamo-nos engolir pelo contingente, negando à boate sua possível metafísica. Prefiro, no entanto poupar meus ouvidos, pois tanto já preciso ouvir... Quiçá um dia convençam a deusa sobre as maravilhas transcendentais do café e jazz. Não serei eu, no entanto: estou longínquo, programando, furando a parede e levando o lixo à lixeira.

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Meses Áridos X - Retomada

São cíclicos os movimentos das nuvens, ainda que imprevisíveis. Mesmo assim, sabe-se que num dia chove, faz frio, venta. Noutro, racha o sol forte e tropical sobre as cabeças. Acontece, porém, que é justo por sermos tropicais é que raro mesmo é um dia de chuva e jazz. Domina o pagode, axé e sol de rachar. Há quem goste, mas há um certo articulista que não aprecia muito este ambiente.

Esqueçamos também a humidade. A mania cartesiana de enfiar a ciência no meio parou por aqui, pois a questão é literária. Parece mesmo que são os tempos, como se isso já não houvesse sido falado algumas dezenas de vezes. Pouco importa. O sujeito senta no banco do ponto de ônibus, mas muitos passam, nenhum é o dele. O calor é insistente. A cerveja faz falta, mas se tem é apenas Itaipava.

Já há muito se fora o elixir da Deusa. Talvez ela estivesse por lá como bom ouvido amigo. Era, porém, uma deusa de tempos remotos. Em tempos aridamente pós-modernos, só mesmo uma deusa kafkiana cairia bem. Embora, claro, ignorando uma provável contradição nos termos.

É uma estátua de jardim, mas fuma com estilo -- ou não fuma? Cada um faz a imagem preferida. Para Kafka, um humano pode verter em barata. Não pode uma estátua de jardim fumar?

O calor não dá trégua. Mais um pouco, a estátua derrete. Será de parafina, sal e água ou água e sal? É estátua mesmo? É vela ou fumante? Cada dia um aspecto, cada dia uma imagem. Um dia um universo, um dia, bem... um universo. Parece não estar no mesmo local. É, parece ser uma estátua. Dessas iluminadas por uma luz macabra, no fundo da mente.

Uma estátua ou objeto sensível regado a uma avaliação transcendental... meio kantiana. Entre o fastio do sol, um abraço sem correspondência e a incerteza das conexões entre objetos metafísicos, há quem não engasgue com tanta poeira de velhice e terra cansada?

Para quem passa a vida levando como hobby (ou profissão) uma arte empírica, cujo fim não é em si, tudo parece distante. São estas as pessoas solitárias, autômatas, cartesianas. Algumas se debatem em suas gaiolas, outras riem-se. Esse riso sim, com o fim em si, vã e rala tentativa de vencer o fastio da vida. Apenas apressa, no entanto, a chegada da aridez.

Há ainda os artíficies dessas ciências com fim em si. Ainda mais perdidos que os fúteis empíricos. Pesquisadores do Instituto Pinéu, tentando racionalizar ou relativizando razões nesta eterna casa da mãe Joana.

É dos tempos? É dos tempos. É de hoje? Talvez não. Só se deu a chance a alguns bocós de mola. Merecem? Vá saber. Nem lembro o que jantei ontem. E já me perdi novamente. Na verdade, na areia o potássio nem conduz. Acabou a sinapse.

Já a sinopse? Ela continua, inacabada, nauseabunda. O tempo insiste em continuar, o clima insiste em secar. Quanto menos água, mais briga. E quem escreve é quem ficou na berlinda tomando só a poeira na cara.

domingo, 1 de maio de 2016

Técnico III (ou IME I)

Há muito pareço estar apartado de meus velhos hábitos. Escrevia frases compridas como fios de macarrão. Os textos eram como spaghetti. O que, porém, terá mudado tanto? Duvido ter havido mudanças significativas, retive minha essência. Tardes se passaram, o sol se pôs milhares de vezes. Às vezes um tépido pôr do sol nublado, às vezes contrastando concreto enegrecido com céu ardente. Milhões de pessoas passaram, carros desceram, subiram. O caos e a confusão perduraram, muitas vezes. Houve paz momentânea. Mas somos paulistanos e a cidade não para jamais.

Esses tempos, porém, ando na mesma daqueles dias longínquos. Sento-me ao computador, abro as linhas de código e vejo se a elas dou melhor sentido do que aquele dado aos meus pensamentos. Num ato pragmático quem sabe não faça daquele código confuso a salvação para a ordem furada desses neurônios? A conjuntura agora é um pouco outra, é verdade. Sento-me ao meu lugar nas aulas de lógica de programação ainda coçando os olhos de sono. Não vejo o sol se por enquanto dou um jeito no Pascal, mas sim o sol raiar enquanto procuro dar sentido a algumas linhas de código C.

Se algo me dá saudade é daquele sintetismo único expressando os problemas da vida imediata. Azedo como Álvaro de Campos, assertivo como um pré-socrático. As imponentes frases impunham uma crítica afiada sobre tudo o que se vivia. Mas que adiantou? Quem é que tira margarina com peixeira?

A vida seguiu seus impulsos. Parte dela virtualizou-se, outra vive-se nos raros momentos de paz na urbe. Mas também não se ignore: no frenesi urbano há vida também. Cada indivíduo opera parte dessa máquina e gritar pela racionalidade ampla, geral e irrestrita parece tentador, mas é jacobinismo e impossibilidade combinados. Afinal, haverá uma consciência coletiva possível?

Juntei-me ao que via como algoz. As granadas de tela luminosa, os torpedos de SMS, as balas de mensagens instantâneas, tudo isso já faz parte do arsenal. Entrei para a guerra, mas luto com a vida e pela vida. Não esta breve e biológica, mas a grande vida humana. Temos nossas causas, nossas razões. Nem tudo se casa, mas a graça está no ponto fora da curva, despojado do plano cartesiano e suas razões quadráticas, cúbicas.

Dizem-me que o computador é cartesiano. Ele é. Por isso não é humano, mas é humano o suficiente enquanto dentre as linhas eletroeletrônicas há humanos trocando convivência e empatia em mensagens e sorrisos emulados. Bits sem vida são só bits sem valor. Deem-me trinta planos cartesianos: em cada um dou uma série de pontos. Os pontos são em si só matéria, mas dentro de minha mente ganham forma. E nisso a quarta dimensão metafísica entrega vida, variação. A forma a apreender a sequência aparentemente aleatória dos signos matemáticos pode não ser a mesma em todos, e nisso está a grande variação do mundo.

Livraria

Este texto começou a ser escrito em 2011, o finalizo agora, quatro anos depois, em homenagem a N. Neme

Cheiro de papel, luz mortiça. Estou em um porão de uma livraria, por assim dizer. Local feito comercial por um feliz (ou infeliz) acaso. É um lugar estranho para se estar a uma hora dessas (seis da tarde, enquanto escrevo). Porém, fui conduzido para cá em troca de bolachas. As mães não dizem para não se falar com estranhos? É, falam, mas quem disse que todos os estranhos são larápios?

Pois não são. Ao menos, sempre espero e nunca deixo de acreditar em uma ideia de que há empatia, ainda, entre nossos congêneres. Mas esta pessoa já não é, há muito, estranha. Dentre os dias nublados e ensolarados é uma constante encontrá-la, de sorriso aberto e animação incomparável, especialmente às 11h30 da manhã, quando o enfado das aulas assistidas mistura-se ao cansaço frente as próximas cinco, seis horas de técnico que em seguida virão.

E essa pessoa já foi estranha um dia. Arrisquei-me a corrigir algumas linhas de código e trocar ideias sobre a vida. Ganhei compreensão, abraços e biscoitos. Eu sei, a vida não é perfeita e tudo tem seu limite. Mas que poderia eu almejar? Em todos esses anos de amores platônicos e amizades incompletas, o plano de mordiscar alguns biscoitos enquanto discute sobre a literatura variada daquele porão, ali na Livraria da Villa, pareceria a joia da coroa.

Assim foi. Mas, ah, essa mania, passada à pena, de colocar tudo no paradigma da troca, do comércio e da balança! Quanto tempo demorarei para entender que não há valor na empatia e a amizade não se mede em ações simétricas. Temos os arranca-rabos e os bons momentos e a questão não é equilíbrio para todo o espaço e tempo – estes meros entes fenomenológicos. Temos as conexões e ali estarão, resistentes ao frio, calor, cidade, campo, praia ou qualquer coisa. Está na metafísica e não na esfera do físico, existente e corruptível.

Então, só me resta o quantitativo imensurável pela matemática dando os níveis da amizade. No fim, como se vê, comprei alguns livros. E a coincidência é engraçada: quem sabe não até me ajudaram a entender melhor essa tal de amizade? Não é estranho estar na livraria às seis, sete ou duas. Estranho é estar só. Esse “estranho”, sim, o mais desgraçado de todos.

Pelas calçadas rachadas da Vila Madalena, rachando espaço com jovens curtindo a sexta e observando o sobe e desce dos ônibus, o movimento dos bares, é que estivemos curtindo a cidade a um som de jazz, estivemos na mesma frequência do dial. Mas agora estamos na livraria. E é como o próximo som da rádio. Dançamos juntos, comemos biscoito. E se esta estranha fora larápia, só o pôde sê-lo por roubar um pouco dessa minha solidão.

E se depois da livraria mudamos de estação, trocamos berros... Bem, há músicas e músicas. Gosto de uma, você de outra. Muitas vezes, ambos gostamos. Mas é irrelevante, saltamos para a próxima conexão, trocamos um abraço. As folhas caem, a chuva lava as ruas, pegamos o trem cheio. A cidade vai passando pelas janelas, trocando os brilhos envidraçados pelas milhares de luzes pontuais. Eis que tal estranha faz-me descer do pedestal dos pragmatismos e cartesianismos. Olho para o vidro e vejo nosso reflexo, e o reflexo da cidade, de tudo. O mundo é grande e estamos nele, mas nos achamos. E de modo ou de outro a vida segue, mas não sozinhos a ela iremos.

sexta-feira, 25 de março de 2016

O moralismo é uma merda

Parece irônico. Como diriam aqueles populares do boteco: “gozado”. É bizarro (alô, J. Traveninsk), mas chegamos lá. Lutou-se contra dominadores, contra moralistas, contra fiscais de vida sexual alheia. Pediu-se uma sociedade mais justa, mais aberta. Sentimentos nobres, bonitos. E aparentemente tão nobres quanto a causa da liberdade individual.

Mas e o resultado, cadê? Alguém bem podia me dizer “sexo só depois do casamento” e isso poderia ser tido como moralismo. Porém, há alguma diferença entre dizer isso e dizer que não posso “fazer piadas ofensivas”? A boca é minha, ora. Falo o que quiser, tape os ouvidos quem se incomodar, a menos que eu esteja na propriedade privada de alguém, porque aí, bem, temos um conflito entre dois indivíduos de ideias distintas. Duelo de cavalheiros, senhores, get the hell out, government.

Era para estarmos mais livres, reza a lenda. Não me parece ser o caso. Para cada frase, termo e até artigos (como categoria lingüística!) podem indicar opressão. Mas minha boca oprime? Porque profiro uma ideia maldita sou dominador, exerço um discurso e provoco piora no quadro social? Ora, quanto poder vocês me colocam nas mãos! Sinto-me lisonjeado, coroado e laureado.

A meu ver, se quem tanto denunciou a opressão da sociedade vitoriana quer agora me colocar uma censura, só posso imaginar que este alguém não pode estar sério. Ou então, como dizem os falantes de inglês: is fighting fire with fire. No fundo, os defensores da igualdade social tem fetiche por poder, porque acham-se dignos de podem enfiar as botas em pescoço alheio. Afinal, não teriam tido botas em seus pescoços também?

Esses indivíduos pós-modernos (e afins) só querem mesmo ser o que jamais poderiam ser normalmente: burgueses. Suas imaginações são tão curtas que não pensam fora do “sistema” que combatem. Gostam de ter empregados, de ter o poder, tendo a impressão de que têm a carta branca para fazer o bem como entendem em suas mentes medíocres. São tão porcos quanto aqueles por eles combatidos. Mas os “porcos combatidos” ao menos tiveram a decência de produzir algo além de chorume intelectual.

Vós, senhores, sois os olhos do poder, que Foucault tanto denuncia. Vós sois os arbitrários a darem as cartas na vida pessoal alheia. Vós sois os fascistas. Um conjunto de velhinhas moralistas. Porque hoje, o ato do coito em praça pública pode até ser arte, mas vaiar nunca. A vaia é criminosa, opressiva.

E se, senhores, escrevo num lapso de raiva, penso que ameaças às liberdades individuais só se revidam com tacape. E aqui estou com quem é grosseiro, com quem xinga e com quem fala o que pensa. E até com Bolsonaro, com quem concordo pouco, mas penso ter todo o direito de falar o que bem entender. Fora, fascistas e fiscaiszinhos de opinião.

quinta-feira, 17 de março de 2016

Apodrecimento do governo, abandono do barco e o barril de pólvora do futuro

Parece-me bastante inútil versar sobre a gravidade da situação. Muita gente já está dizendo isso e o juiz a suspender a posse de Luís Inácio da Silva como ministro dá bons motivos para se considerar a situação grave. De qualquer modo, o ex-presidente sofre processos judiciais e nunca é de bom tom enfrentar a justiça se você tem a certeza da inocência. Mas isso ignoraram, o que é bom, porque aí chegamos à parte em que o indefensável fez quase todo mundo pular do barco.

Alguns não pularam, mas afundarão junto com ele. Inútil falar sobre isso. Os próximos a assumir o governo provavelmente quererão abandonar a pecha de defensores de gente corrupta, mas provavelmente também querem evitar um desgaste prematuro – de qualquer modo desgastar-se-ão frente à continuidade da Operação Lavajato, cujo objetivo é investigar a corrupção na alta esfera política e não derrubar o governo, simplesmente.

Caso o governo caia – o que ainda não é certo, cabe lembrar – não será o último. Resquícios da base, opositores de índole dúbia, fisiologistas famosos... Pouco a pouco serão riscados. A manobra de Moro parece ilegal, a princípio. E também imparcial, por “perseguir” apenas membros da gestão. Contudo, não deveria haver dúvidas: é de maior urgência ir atrás de membros envolvidos com um governo ativo. Por quê? Simples, gente de má índole governando prejudica o interesse público diretamente.

E não estamos falando de gente pouco artificiosa. Moro agiu com a máxima legalidade possível, se escapou a ela em um ou outro detalhe – o que não me parece o caso, mas suponhamos – foi apenas com o intuito de estar um passo a frente a quem tem inclusive instrumentos para obstruir a justiça. Um desses instrumentos é conceder o foro privilegiado, tal como estamos assistindo.

Desse modo, é bobagem falar em golpe. Se falarmos em golpe, só se for aquele desferido por aqueles que tanto chamavam os outros de golpistas.

A justiça deve ser feita conforme a lei. E está sendo. Mas, às vezes, em nome da lei – e existem muitas no Brasil, incluindo algumas conflituosas com outras – é necessário agir com uma rapidez muitas vezes não permitida normalmente ao sistema judiciário brasileiro, famoso por seu passo arrastado pelos infinitos recursos possíveis. S. Moro correu contra o relógio, antecipou sem aviso prévio alguns de seus movimentos. E o resto foi trabalho da polícia.

Ninguém pode criticar Moro por nada além de meras questões de data. E mesmo estas críticas merecem no mínimo um perdão, se comprovado que os acusados estavam deliberadamente destruindo provas e obstruindo a justiça – cabe relembrar: eles estão no poder.

Parece mesmo que os passos da justiça são mais uma questão de lógica do que de política.

Dito isso, lembremo-nos de que há um barril de pólvora aguardando por nós no fim desse túnel. A luz vista ali pode ser apenas a fagulha do pavio. E não será uma explosão provocada por meia dúzia de milicianos armados defendendo algo que já morreu. Tampouco uma nova cartada do governo (a essa altura já devem ter usado seu último curinga). É pior: são os resquícios ideológicos.

A história se repete como farsa. Como caricaturas do que gostariam realmente de ser, os universitários e seus professores podem até ser críticos ao governo, mas continuarão combatendo o “retrocesso”. Progressistas que são, continuarão encantados com uma certa ideia de igualdade. Por isso não se alinham de jeito nenhum ao que chamam de “direita”. Ficam no limiar, educando jovens a apoiarem a ideia do mundo mais igualitário e supostamente justo. Uma clara aberração antropológica.

Isto é, os jovens futuramente formadores de opinião (professores, jornalistas etc.) continuarão pensando tortamente, fazendo com que repitamos o erro mais algumas vezes. A conjuntura não é tão diferente, em essência, do que ocorreu com o PT em seu início. Era gente universitária honesta e fiel a seus princípios. Depois juntaram-se aos sindicalistas. E com estes aprenderam que a vida não era fácil, mas podia ficar se fossem espertos o suficiente. A conjuntura atual parece mostrar que aprenderam bem a lição. Mas mesmo a cara de pau tem limite.

Por outro lado, o que se chama de “direita” é uma massa apócrifa e ainda fortemente estatista – e não só: parece também ser propensa a engrossar o coro de alguns inflamados populistas. Este conjunto pode tornar-se fascista, a depender de uma série de fatores. Um deles é o possível recrudescimento das esquerdas (elas são minoritárias, mas nada supera seus megafones – exceto os perueiros de Cotia quando anunciam aos berros o destino da condução, ao estacionarem na estação Butantã).

Esta massa apócrifa pode rachar em apoiadores de J. Bolsonaro e M. Silva. Ambos problemáticos por motivos que, creio eu, são conhecidos por todos, mas resumirei: Bolsonaro é estatista e defende um conservadorismo torpe. Marina é dos verdinhos, adora afagar as ONGs estrangeiras e tem posicionamento político dúbio. Ainda sim, ambos parecem ter mais a ver com o espírito “apolítico” do brasileiro do que os inflamados petistas, cuja pretensão é saber o que é melhor para seu povo, tal como o Príncipe.

Mas o fato é que as coisas continuarão estagnadas. Ainda que as instituições democráticas se fortaleçam, a mediocridade prevalecerá. E a silenciosa guerra ideológica entre classes implantada nos jovens ainda provocará entreolhares cheios de ódio pelas ruas. O “nós contra eles” ainda fará vítimas da criminalidade e gerará outros conflitos sociais.

A única esperança é realmente o mercado. Apenas uma melhora econômica pode, a essa altura do campeonato, ensinar as vantagens de uma política econômica mais liberal e que as chances de igualdade são maiores quando o governo não interfere nas relações interpessoais. Uma economia mais forte, em que há atividade para todos e mais oportunidades, resta pouco tempo ao azedume do velho e desgastado discurso do “social”. Só que a economia é uma caixinha de surpresas e não me arrisco a fazer previsões, por ora. Aguardemos.