quinta-feira, 17 de março de 2016

Apodrecimento do governo, abandono do barco e o barril de pólvora do futuro

Parece-me bastante inútil versar sobre a gravidade da situação. Muita gente já está dizendo isso e o juiz a suspender a posse de Luís Inácio da Silva como ministro dá bons motivos para se considerar a situação grave. De qualquer modo, o ex-presidente sofre processos judiciais e nunca é de bom tom enfrentar a justiça se você tem a certeza da inocência. Mas isso ignoraram, o que é bom, porque aí chegamos à parte em que o indefensável fez quase todo mundo pular do barco.

Alguns não pularam, mas afundarão junto com ele. Inútil falar sobre isso. Os próximos a assumir o governo provavelmente quererão abandonar a pecha de defensores de gente corrupta, mas provavelmente também querem evitar um desgaste prematuro – de qualquer modo desgastar-se-ão frente à continuidade da Operação Lavajato, cujo objetivo é investigar a corrupção na alta esfera política e não derrubar o governo, simplesmente.

Caso o governo caia – o que ainda não é certo, cabe lembrar – não será o último. Resquícios da base, opositores de índole dúbia, fisiologistas famosos... Pouco a pouco serão riscados. A manobra de Moro parece ilegal, a princípio. E também imparcial, por “perseguir” apenas membros da gestão. Contudo, não deveria haver dúvidas: é de maior urgência ir atrás de membros envolvidos com um governo ativo. Por quê? Simples, gente de má índole governando prejudica o interesse público diretamente.

E não estamos falando de gente pouco artificiosa. Moro agiu com a máxima legalidade possível, se escapou a ela em um ou outro detalhe – o que não me parece o caso, mas suponhamos – foi apenas com o intuito de estar um passo a frente a quem tem inclusive instrumentos para obstruir a justiça. Um desses instrumentos é conceder o foro privilegiado, tal como estamos assistindo.

Desse modo, é bobagem falar em golpe. Se falarmos em golpe, só se for aquele desferido por aqueles que tanto chamavam os outros de golpistas.

A justiça deve ser feita conforme a lei. E está sendo. Mas, às vezes, em nome da lei – e existem muitas no Brasil, incluindo algumas conflituosas com outras – é necessário agir com uma rapidez muitas vezes não permitida normalmente ao sistema judiciário brasileiro, famoso por seu passo arrastado pelos infinitos recursos possíveis. S. Moro correu contra o relógio, antecipou sem aviso prévio alguns de seus movimentos. E o resto foi trabalho da polícia.

Ninguém pode criticar Moro por nada além de meras questões de data. E mesmo estas críticas merecem no mínimo um perdão, se comprovado que os acusados estavam deliberadamente destruindo provas e obstruindo a justiça – cabe relembrar: eles estão no poder.

Parece mesmo que os passos da justiça são mais uma questão de lógica do que de política.

Dito isso, lembremo-nos de que há um barril de pólvora aguardando por nós no fim desse túnel. A luz vista ali pode ser apenas a fagulha do pavio. E não será uma explosão provocada por meia dúzia de milicianos armados defendendo algo que já morreu. Tampouco uma nova cartada do governo (a essa altura já devem ter usado seu último curinga). É pior: são os resquícios ideológicos.

A história se repete como farsa. Como caricaturas do que gostariam realmente de ser, os universitários e seus professores podem até ser críticos ao governo, mas continuarão combatendo o “retrocesso”. Progressistas que são, continuarão encantados com uma certa ideia de igualdade. Por isso não se alinham de jeito nenhum ao que chamam de “direita”. Ficam no limiar, educando jovens a apoiarem a ideia do mundo mais igualitário e supostamente justo. Uma clara aberração antropológica.

Isto é, os jovens futuramente formadores de opinião (professores, jornalistas etc.) continuarão pensando tortamente, fazendo com que repitamos o erro mais algumas vezes. A conjuntura não é tão diferente, em essência, do que ocorreu com o PT em seu início. Era gente universitária honesta e fiel a seus princípios. Depois juntaram-se aos sindicalistas. E com estes aprenderam que a vida não era fácil, mas podia ficar se fossem espertos o suficiente. A conjuntura atual parece mostrar que aprenderam bem a lição. Mas mesmo a cara de pau tem limite.

Por outro lado, o que se chama de “direita” é uma massa apócrifa e ainda fortemente estatista – e não só: parece também ser propensa a engrossar o coro de alguns inflamados populistas. Este conjunto pode tornar-se fascista, a depender de uma série de fatores. Um deles é o possível recrudescimento das esquerdas (elas são minoritárias, mas nada supera seus megafones – exceto os perueiros de Cotia quando anunciam aos berros o destino da condução, ao estacionarem na estação Butantã).

Esta massa apócrifa pode rachar em apoiadores de J. Bolsonaro e M. Silva. Ambos problemáticos por motivos que, creio eu, são conhecidos por todos, mas resumirei: Bolsonaro é estatista e defende um conservadorismo torpe. Marina é dos verdinhos, adora afagar as ONGs estrangeiras e tem posicionamento político dúbio. Ainda sim, ambos parecem ter mais a ver com o espírito “apolítico” do brasileiro do que os inflamados petistas, cuja pretensão é saber o que é melhor para seu povo, tal como o Príncipe.

Mas o fato é que as coisas continuarão estagnadas. Ainda que as instituições democráticas se fortaleçam, a mediocridade prevalecerá. E a silenciosa guerra ideológica entre classes implantada nos jovens ainda provocará entreolhares cheios de ódio pelas ruas. O “nós contra eles” ainda fará vítimas da criminalidade e gerará outros conflitos sociais.

A única esperança é realmente o mercado. Apenas uma melhora econômica pode, a essa altura do campeonato, ensinar as vantagens de uma política econômica mais liberal e que as chances de igualdade são maiores quando o governo não interfere nas relações interpessoais. Uma economia mais forte, em que há atividade para todos e mais oportunidades, resta pouco tempo ao azedume do velho e desgastado discurso do “social”. Só que a economia é uma caixinha de surpresas e não me arrisco a fazer previsões, por ora. Aguardemos.

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